É questão de tempo para o Brasil se livrar de Bolsonaro. Seja pelo impeachment, seja pelo voto
O Brasil viveu, na semana do último dia 7 de Setembro, uma tentativa de golpe, estimulado pelo próprio chefe da nação, e que só não prosperou porque instituições como o Supremo Tribunal Federal barraram os planos e as ações dos golpistas. Formou-se uma verdadeira frente ampla para fazer a contenção institucional dos manifestantes e seus patrocinadores que invadiram a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, com ameaças e violência.
Que ninguém se engane: o ato golpista teve método e não foi apenas um desatino de meia dúzia de pessoas. Empresários e caminhoneiros, por exemplo, iniciaram uma paralisação para bloquear rodovias em várias partes do País e se recusaram a deixar a capital federal. Eles não foram adiante com a sabotagem porque Jair Bolsonaro foi obrigado a negociar um recuo, ao divulgar uma carta, escrita pelo ex-presidente Michel Temer, para baixar a temperatura que ele mesmo elevou.
Preferiria estar errado, mas não vejo sinceridade no conteúdo daquela carta divulgada pelo Palácio do Planalto. A mensagem carece de consistência. Espero que se mantenha um clima de trégua pelo maior tempo possível nas próximas semanas – o que é bastante improvável, dado o histórico dos milicianos e fanáticos.
O problema do Brasil é que Bolsonaro é viciado na estratégia de guerra permanente contra as instituições e a sociedade. Para usar a linguagem militar, não há mais a separação entre os tempos de paz e os de conflito. Resultado: a população brasileira está pagando um preço altíssimo com os erros na coordenação nacional sobre a pandemia, a volta da inflação, os 14 milhões de desempregados, o aumento do número das pessoas na pobreza, a destruição ambiental e o fraco crescimento da economia.
Em dois anos e oito meses de gestão, o presidente da República jamais apresentou um projeto para resolver os problemas do País. A única preocupação é manter o ambiente político conflagrado à espera das eleições presidenciais de 2022. Até lá, a travessia tende a ser bastante turbulenta, pois o presidente se vê a caminho de uma derrota, manifesta temor de ser preso e mantém uma base radicalizada de apoiadores.
A campanha presidencial deverá ser conflagrada pelo extremismo, puxado pela extrema-direita, que se recusa a seguir as regras democráticas. A situação brasileira de hoje é bastante semelhante à do nazifascismo europeu dos anos 1930. O método, a linguagem e a ideia de eliminação de inimigos são os mesmos, agravando-se tudo com o uso intenso da internet.
O presidente seguirá tentando intimidar o STF, para barrar inquéritos e processos contra os seus familiares e apoiadores, e buscará deslegitimar o Tribunal Superior Eleitoral. Destaco que, mesmo havendo críticas de alguns quanto ao ativismo do Judiciário, até agora o Supremo mais acertou do que errou.
O apoio político ao presidente resume-se atualmente a grupos minoritários na sociedade, em setores como Forças Armadas, Polícias Militares e o agronegócio. Mas não se trata de maiorias em tais segmentos. Não poderemos baixar a guarda daqui para a frente, até a posse do próximo presidente em 2023. É temerário não reagir contra aqueles que trabalham abertamente para uma ruptura da democracia, como se viu na tentativa fracassada de 7 de Setembro.
O governo conta ainda com uma base parlamentar considerável no Congresso Nacional, que passou a controlar, de modo inédito, o Orçamento da União e a sua execução. Esse grupo de apoio impede a instauração do processo de impeachment contra o presidente da República. Mas será difícil manter o apoio, em 2022, de senadores e deputados que estão vendo os estragos do desgoverno federal em seus estados, a exemplo da destruição de rodovias federais.
Temos, assim, um paradoxo: lamentamos que tenhamos um presidente antidemocrático e antinacional, mas, ao mesmo tempo, celebramos que o golpe de 7 de Setembro fracassou. Nosso esforço deve ser para que o máximo de setores promova uma união em defesa da Constituição. E que os políticos voltem a cuidar da vida concreta da população, massacrada pelas crises sanitária e socioeconômica. Devemos, por exemplo, cobrar do governo federal medidas efetivas contra a inflação. Chega da tentativa ridícula de transferir responsabilidade aos governadores, em intermináveis bravatas de “cercadinhos”.
Os governadores estão abertos ao diálogo com todos os Poderes do País e os diversos setores da sociedade. Inclusive, pedimos um encontro com o chefe do Executivo Federal, mas nem resposta houve. Graças a Deus, é questão de tempo para o Brasil se livrar desse estorvo, seja pelo impeachment, seja pelo voto nas urnas.
Fonte: Carta Capital